Doenças reumáticas e risco cardiovascular

Você sabia que as doenças cardiovasculares representam as principais causas de mortes entre brasileiros? E que, infelizmente, esse é um ponto de atenção importantíssimo para pessoas com doenças reumáticas autoimunes?

Segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), o Setembro Vermelho é uma ação que te por objetivo, justamente, divulgar a importância de cuidar do coração e de prevenir e tratar as doenças cardiovasculares. 

Segundo vários estudos e literatura médicas, portadores de doenças autoimunes reumatológicas, principalmente Artrite Reumatoide (AR), Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES), Esclerose Sistêmica (ES), Síndrome Antifosfolípide (SAF), Artrite Psoriásica (AP) e Espondilite Anquilosante (EA), possuem maior risco de complicações cardiovasculares se comparados à população em geral.

Entre os mecanismos envolvidos nesse quadro estão a presença de maior número de fatores de risco 
 a formação de placas de gordura nas artérias e o uso de alguns medicamentos para o tratamento dessas doenças.

1. Fatores de risco cardiovasculares tradicionais:

Os portadores de doenças reumáticas autoimunes apresentam maior número de fatores de risco cardiovasculares tradicionais que a população geral e alguns importantes estudos demonstram que esse seria o principal elemento no aumento da mortalidade cardiovascular.

Na AR, os principais fatores presentes são hipertensão arterial, tabagismo, níveis elevados de gordura no sangue (dislipidemia) e síndrome metabólica. São também fatores de risco a própria inflamação trazida pela doença, a trombofilia e a resistência à insulina.

No LES, estão presentes a hipertensão arterial, síndrome metabólica, dislipidemia, obesidade e diabetes.

Na AP, síndrome metabólica, diabetes, obesidade, dislipidemia e hipertensão arterial, além das comorbidades presentes com a própria doença, como depressão e esteatose hepática.

A EA está associada à maior prevalência de síndrome metabólica, mas outra possível explicação envolve também o tabagismo, a hipertensão arterial e a dislipidemia.

Já na ES, destaca-se a redução dos níveis de HDL, o colesterol bom.

E na SAFhipertensão, diabetes, obesidade, dislipidemia, tabagismo, sedentarismo e síndrome metabólica estão presentes.

2. Formação das placas de aterosclerose nos vasos sanguíneos:

A aterosclerose é uma condição crônica, caracterizada por um grande processo inflamatório que acontece devido ao acúmulo de placas de gordura em veias e artérias. Tais placas são formadas principalmente pelo colesterol ruim, o LDL.

Esse processo tem grande semelhança com o que ocorre no tecido que reveste as articulações (a membrana sinovial) afetadas pelas artrites reumáticas autoimunes:

  • Aterosclerose e Artrites são processos de inflamação: de baixo grau na aterosclerose e de alto grau nas artrites inflamatórias.
  • Aterosclerose e algumas artrites inflamatórias têm fatores de risco em comum.
  • Aterosclerose e Artrites compartilham o mesmo padrão de resposta inflamatória, com os mesmos tipos de células imunológicas encontradas tanto no interior da placa quanto no interior da membrana sinovial articular.
  • Em ambas, há participação ativa das células que revestem os vasos (as chamadas células endoteliais), encontradas nas artérias do corpo acometidas por aterosclerose e também nos pequenos vasos inflamados da membrana sinovial articular.
  • Aterosclerose e Artrites compartilham a participação das mesmas substâncias inflamatórias, chamadas de citocinas e quimiocinas.
  • Em ambos os processos, são as moléculas de colesterol, especificamente o LDL, que geram uma resposta inflamatória.
  • Nas duas condições, substâncias produzidas por células inflamatórias, de nome metaloproteases, produzem dano, seja com destruição do tecido articular, seja com rompimento da placa de aterosclerose e consequente oclusão aguda do fluxo sanguíneo.

Dessa forma, não é surpresa que os pacientes portadores de artrites reumáticas autoimunes tenham maior risco de mortalidade de causa cardiovascular, em grande parte por apresentarem aterosclerose acelerada. São mais frequentemente acometidos por infarto agudo do miocárdio (IAM) e acidente vascular cerebral (AVC) que a população geral. Além disso, tais placas podem resultar no bloqueio do fluxo sanguíneo em artérias que irrigam órgãos vitais, podendo prejudicar seu correto funcionamento.

Estudos demonstraram que o LES apresenta um risco 5-10 vezes maior de evento coronariano comparado à população geral, sendo este 50 vezes maior em mulheres na faixa entre 35 e 44 anos. O processo de Aterosclerose aqui se deve a múltiplos fatores, mas a própria doença parece ser o fator desencadeador, agravada pelos fatores de risco cardiovasculares tradicionais.

A ES é uma doença que se caracteriza por afetar principalmente a microcirculação do(a) portador(a) da doença, mas a inflamação pode levar também à disfunção macrovascular e, finalmente, à aterosclerose. Estudo populacional recente identificou que o risco de infarto agudo do miocárdio e de acidente vasculoencefálico é 2 vezes maior em pacientes com ES.

A EA está associada com risco cardiovascular aumentado e na AP, o processo de Aterosclerose é o principal responsável pela ocorrência de eventos cardiovasculares e sua formação está diretamente relacionada a um processo inflamatório vascular crônico. Estudos mostram que pacientes com psoríase apresentam maior risco de infarto agudo do miocárdio e acidente vasculoencefálico em comparação à população sem AP, principalmente em pacientes do sexo masculino e com idade mais avançada.

Já a AR é considerada um fator de risco por si só para desfechos cardiovasculares. Entre as doenças cardíacas relacionadas à AR, a doença arterial aterosclerótica é a principal causa de morte prematura e, ao compararmos com a população em geral, o risco é 2 vezes maior. A inflamação descontrolada predetermina o aparecimento da aterosclerose e, na presença de um processo inflamatório ativo, normalmente os níveis de colesterol total, LDL e HDL tendem a baixar. Entretanto, estudiosos observaram que durante o tratamento da AR e na remissão da doença com normalização da proteína C-reativa, esse perfil se altera, com elevação desses níveis.

3. Medicamentos:

Os medicamentos utilizados para o tratamento de doenças reumáticas autoimunes podem exercer efeito de piora do risco cardiovascular, mas também de proteção. Avaliação da tendência do risco cardiovascular na população em questão, demonstrou melhora nos indicadores de mortalidade cardiovascular a partir dos anos 2000, marco da introdução dos medicamentos imunobiológicos.

Anti-inflamatórios não hormonais e corticóides aumentam comprovadamente o risco cardiovascular na população geral. No entanto, nos portadores de doenças reumáticas autoimunes, esse efeito pode ser atenuado com um maior controle da inflamação. Devem ser usados com cautela e na menor dose possível.

Já hidroxicloroquina, metotrexato e imunobiológicos anti-TNF são considerados “amigos do coração”, são cardioprotetores.









Referências:

FINOTTI, Leandro T. Risco cardiovascular e doenças reumáticas autoimunes. Disponível em:http://www.drleandrofinotti.com.br/artigo/risco-cardiovascular-e-doencas-reumaticas-autoimunes/72. Acesso: 03/09/22.

NETO, Eduardo F.B; CARVALHO, Jozélio F.; RODRIGUES, Carlos W. M. Doença aterosclerótica associada com artropatias inflamatórias e doenças difusas do tecido conjuntivo. In: Livro da Sociedade Brasileira de Reumatologia. Barueri (SP): Manole, 2019, p. 642-646.

SOCIEDADE MINEIRA DE REUMATOLOGIA. Risco cardiovascular das doenças reumáticas. Disponível em: http://reumatominas.com.br/risco-cardiovascular-das-doencas-reumaticas-2/. Acesso: 03/09/22.