Artrite reumatoide

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a Artrite reumatoide (AR) afeta 1 em cada 100 pessoas, o que a coloca como uma das doenças reumáticas mais comuns em todo o mundo.


O que é? Quem pode ser afetado(a)? 

A Artrite reumatoide (AR) é uma doença autoimune, crônica e progressiva que causa inflamação no revestimento das articulações - a membrana sinovial -, sobretudo de mãos, punhos, pés, joelhos e ombros, embora outros órgãos e tecidos também possam ser acometidos. Atinge pessoas de todas as raças, idades e gêneros, embora afete mais mulheres que homens (cerca de duas vezes mais). 

Dentre as artrites, é considerada a mais incapacitante, pois pode ocasionar deformidades que fazem com que os pacientes percam a mobilidade para o trabalho e para as atividades da vida social e de lazer. Entretanto, com tratamento adequado, a doença pode ser melhor controlada e, até mesmo, pode-se conseguir a remissão, isto é, a ausência dos sintomas. Por isso, é muito importante consultar um(a) reumatologista aos primeiros sinais da doença pois, quanto mais cedo for o início do tratamento, maiores são as chances de sucesso. 


Qual a causa?

Como já dito, a AR é uma doença autoimune, ou seja, há uma desregulação do sistema imunológico (que garante a defesa do organismo) e, quando o corpo é apresentado a algum fator que considere uma "ameaça", tal sistema dá uma resposta imune exagerada e acaba por atacar a membrana sinovial que, até então, estava saudável. A partir daí, ocorre a inflamação, que pode, inclusive, levar à destruição óssea e cartilaginosa.

A causa desse mal funcionamento ainda é desconhecida, mas acredita-se que alguns fatores possam desencadear a doença, tais como: 
  • predisposição genética que, embora não seja determinante, aumenta o risco de desenvolvimento da doença em cerca de três vezes em parentes de primeiro grau de pessoas com AR; 
  • desequilíbrio hormonal, o que justifica o fato da doença ocorrer mais em mulheres e apresentar melhora clínica no período da gestação; 
  • alterações na microbiota intestinal, ou seja, na população de microorganismos (bactérias, vírus e fungos) que habitam o sistema gastrointestinal e que tem como uma das funções controlar a proliferação de bactérias "perigosas" ao organismo; 
  • infecções como a periodontite (infecção bacteriana de tecidos, ligamentos e ossos específicos que envolvem e sustentam os dentes) ou infecções articulares causadas por vírus (como Epstein-Barr ou parvovírus, entre outros); 
  • certos hábitos dietéticos, como a obesidade ou o consumo excessivo de sal e café; 
  • deficiência de vitamina D; 
  • tabagismo, mesmo que o(a) paciente não fume mais. 

Quanto maior for o número de fatores associados, maior será o risco de desenvolvimento da doença.


Quais os sintomas?

A AR é uma doença sistêmica, que apresenta sintomas gerais como cansaço, fraqueza, febre baixa, diminuição do apetite com perda de peso, além de dor frequente. 

Os sintomas articulares mais comuns são inflamação, calor, vermelhidão, rigidez e limitações de movimento nas articulações atingidas. Mãos e punhos são afetados em quase todos os pacientes, com alargamento e inchaço nas articulações e, nas fases mais avançadas da doença, ocorrência de deformidades (fig. 1), características que configuram a chamada "mão reumatoide".


Fig. 1


Dentre as deformidades, as mais comuns são "desvio ulnar", "dedo em pescoço de cisne", "dedo em botoeira" e, ainda, "sinovite de articulações" (fig. 2).



Fig. 2

Pode ocorrer também a compressão (pressão) dos nervos, que gera manifestações como:
  • "síndrome do túnel do carpo"que causa formigamento e dormência na mão; 
  • "síndrome do canal de Guyon"que causa dor e queimação na mão e no punho, além de fraqueza, dormência e perda de sensibilidade em alguns dos dedos;
  • "dedo em gatilho"inflamação do tendão que faz com que o dedo afetado fique sempre dobrado, causando dor intensa na mão. 

As ocorrências em pés e tornozelos também são frequentes e, geralmente, bastante incapacitantes, uma vez que essas são estruturas responsáveis por suportar o peso do corpo. Podem ocorrer deformidades e desvios nos dedos, além de inflamações, inclusive na planta dos pés. A compressão do nervo tibial posterior pode ocasionar a "síndrome do túnel do tarso", que causa dores no arco do pé e no calcanhar, além de formigamento e redução da sensibilidade e, em casos mais sérios, atrofia e fraqueza do pé. 

Nos ombros pode ocorrer rigidez articular e possível perda de mobilidade causada pela dor e pela inflamação, sintomas típicos da "síndrome do ombro congelado" (capsulite adesiva).

Outras articulações afetadas são as de cotovelos, joelhos e quadris, os quais apresentam dor e limitações de movimentos. O acometimento da articulação temporomandibular (que controla a mandíbula e, portanto, o movimento de abrir e fechar a boca) é relativamente comum e pode causar dor de cabeça, dor no ouvido e dificuldade de mastigação. 

O envolvimento da coluna cervical é também bastante comum e, geralmente, manifesta-se por dor que “caminha” para a região atrás da cabeça e dificuldade para mexer o pescoço. 

A AR pode atingir também outros órgãos e sistemas, gerando manifestações extra-articulares. Na pele, os "nódulos reumatoides" estão presentes em cerca de 30% dos pacientes e são mais frequentes no cotovelo, no calcanhar, no ísquio (osso na região do quadril) e nos dedos. Tais nódulos estão diretamente relacionados com a atividade da doença, ou seja, tendem a desaparecer com o controle da AR (mas podem também permanecer...).

Fig. 3


A doença pode causar, ainda, inflamações graves nos olhos, rins, coração, sistemas nervoso, gastrointestinal e respiratório. A mortalidade por doenças respiratórias em portadores de AR, aliás, é duas vezes maior em relação à população em geral. Os quadros pulmonares podem ser desencadeados pela própria doença ou pela terapia utilizada, como certos antirreumáticos modificadores da doença sintéticos (sDMARD) e/ou biológicos (bDMARD).

Osteoporose (e sua fase anterior, a osteopenia) é usual, pois na AR ocorre uma desmineralização óssea próxima às articulações afetadas em decorrência do processo inflamatório. Também é comum a associação com outras síndromes dolorosas, como a Fibromialgia

Por fim, não é raro que pacientes com a doença, por terem de lidar com dores, presença de deformidades e limitação de movimentos, apresentem também quadros de depressão e alterações no comportamento.


Como é feito o diagnóstico? 

O diagnóstico baseia-se em critérios clínicos, aliados a exames laboratoriais e radiológicos. No exame clínico, o(a) médico(a) reumatologista avalia a presença de, ao menos, alguns dos critérios abaixo: 
  • Rigidez articular prolongada (mais de 1 hora), caracterizada por rigidez e sensação de inchaço, principalmente pela manhã;
  • Artrite poliarticular, isto é, em três ou mais articulações (embora seja mais raro, a doença pode também ser monoarticular, ou seja, afetar apenas uma articulação);
  • Artrite de articulações de mãos: acometimento de punhos, interfalangeanas proximais (meio dos dedos) e metacarpofalangeana (entre os dedos e mãos) por mais de 6 semanas;
  • Inflamação simétrica, ou seja, nos dois lados do corpo, por exemplo, nas mãos direita e esquerda; nos punhos direito e esquerdo etc.;
  • Presença de nódulos reumatoides.

Além desses fatores, exames laboratoriais são úteis não apenas para ajudar no diagnóstico da doença, mas também para o acompanhamento da atividade da AR. Para avaliar a atividade inflamatória, os exames velocidade de hemossedimentação (VHS) e proteína C-reativa (PCR) são os mais empregados. 

Outros exames utilizados são fator reumatoide (FR), que pode estar presente em situações diversas de estímulo do sistema imune, como nas doenças autoimunes e nas infecções crônicas, e anti-CCP, que apresenta melhor especificidade em relação ao FR (acima de 90%), sendo então útil para o diagnóstico diferencial de poliartrites e outras situações que apresentem FR positivo. 

Para avaliar possíveis danos às articulações (como erosões ósseas ou destruição das cartilagens) são empregadas primeiramente radiografias e, se necessário, ultrassonografia e ressonância magnética.

Como é o tratamento?

Embora não exista cura para a AR, a doença pode ser controlada e ter seus sintomas reduzidos. Assim, quanto mais cedo for diagnosticada e for iniciado o tratamento, melhor será o controle da atividade da doença, proporcionando ao(à) paciente alívio dos sintomas (e, consequentemente, uma vida mais ativa) e, ainda, reduzindo as chances de algum tipo de lesão articular permanente. 

O objetivo do tratamento, então, é atenuar a dor e o inchaço das articulações e melhorar a capacidade do(a) paciente de realizar suas atividades cotidianas. O(A) reumatologista costuma prescrever anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) e corticosteroides, especialmente Prednisona ou Prednisolona, em associação com drogas antirreumáticas modificadoras da doença sintéticos, as sDMARD, que servem para aliviar os sintomas e também para retardar a progressão do dano articular. As drogas mais utilizadas são Metotrexato, Leflunomida, Sulfassalazina, Cloroquina e Hidroxicloroquina. Metotrexato, sozinho ou em combinação com outros medicamentos, é considerado a opção de primeira linha. Hidroxicloroquina ou Cloroquina costumam ser considerados em caso de baixo potencial erosivo da doença. 

Em caso de toxidade e/ou falha na resposta aos sDMARD, o(a) médico poderá prescrever uma das drogas antirreumáticas modificadoras da doença biológicos, as bDMARD, medicamentos que reconhecem alvos específicos que tem funções importantes na resposta imune. No Brasil, podem ser utilizados: 
    • medicamentos que bloqueiam o fator de necrose celular alfa (os anti-TNF): Adalimumabe, Certolizumabe pegol, Etanercepte, Golimumabe e Infliximabe
    • medicamento de depleção de linfócitos: Abatacepte e Rituximabe;
    • medicamento inibidor do receptor da interleucina 6 (antirreceptor IL-6): Tocilizumabe. 
  • sintéticos alvo-específico inibidores da enzima intracelular JAK: Tofacitinibe e Baricitinibe.

O tratamento também deve incluir fisioterapia e terapia ocupacional, além de alimentação adequada e atividades físicas, sobretudo para fortalecer a musculatura como um todo, pois os músculos dão sustentação às articulações, e para manter o condicionamento cardiovascular e níveis controlados de pressão arterial e de lipídios no sangue ou colesterol. Quando necessário, pode haver infiltrações intra-articulares ou procedimentos cirúrgicos.



Referências

AMERICAN COLLEGE OF RHEUMATOLOGY. Rheumatoid Arthritis. Disponível em:http://www.rheumatology.org/I-Am-A/Patient-Caregiver/Diseases-Conditions/Rheumatoid-ArthritisAcesso: 21/09/19. 

ARTHRITIS FOUNDATION. Artritis reumatoide. Disponível em: http://espanol.arthritis.org/espanol/disease-center/artritis-reumatoide/Acesso: 21/09/19.
MOTA, Lícia Maria H. et al. Artrite reumatoide. In: Livro da Sociedade Brasileira de Reumatologia. Barueri (SP), Manole, 2019, p. 134-149.

REUMATO USP. Artrite Reumatóide. Disponível em: http://www.reumatousp.med.br/para-pacientes.php?id=60255201&idSecao=18294311Acesso: 19/09/19.

SOCIEDADE BRASILEIRA DE REUMATOLOGIA. Artrite Reumatoide. Disponível em: http://www.reumatologia.org.br/doencas-reumaticas/artrite-reumatoideAcesso: 19/09/19.