Artrite reumatoide, medicamentos biológicos e infecções


A disponibilidade de medicamentos para o tratamento de pacientes reumáticos cresceu substancialmente nas últimas décadas. Medicamentos antirreumáticos modificadores da doença sintéticos (sDMARD) e biológicos (bDMARD), aqui incluídos os biossimilares, estão amplamente à disposição dos reumatologistas. Isso, naturalmente, implica escolhas a serem feitas quanto ao melhor tratamento para determinado paciente e tais decisões são feitas, via de regra, com base nas expectativas da eficiência de um medicamento. Mas outros aspectos, entre eles, a segurança do medicamento, devem ter um lugar central na tomada de decisão.


Estudos observacionais podem fornecer informações mais relevantes nesse quesito segurança porque, diferentemente dos chamados ensaios clínicos (que são patrocinados, principalmente, por agências oficiais de incentivo à pesquisa e também pela indústria farmacêutica), eles incluem um grupo não selecionado de pacientes, representam a prática médica diária e abrangem um período mais longo de tempo.

Em 2016, um grupo de pesquisadores de diferentes universidades*  com o objetivo de atualizar a Liga Europeia Contra o Reumatismo (EULAR) com recomendações para a gestão da Artrite Reumatoide (AR) , realizou uma pesquisa, a partir de revisão sistemática da literatura médica, para avaliar a segurança de sDMARD e bDMARD para o tratamento da AR.

Para tanto, foram selecionados estudos observacionais que comparassem qualquer DMARD com outros tipos de tratamento para pacientes adultos com AR. Todos os resultados de segurança foram considerados, incluindo infecções graves e oportunistas (como tuberculose e herpes zoster), doenças malignas, mortalidade, doenças cardiovasculares, alteração dos níveis lipídicos, comprometimento da função dos rins, elevação das enzimas do fígado, anormalidades no sangue, efeitos gastrointestinais, doença desmielinizante (doença do sistema nervoso na qual a bainha de mielina dos neurônios é danificada), indução de doença autoimune e teratogenicidade (capacidade de produzir malformações congênitas no feto).

A pesquisa incluiu os seguintes DMARDs sintéticos (convencionais e alvo-dirigidos) e biológicos (incluindo os biossimilares): metotrexato, leflunomida, hidroxicloroquina, cloroquina, sulfassalazina, ouro/auranofina, azatioprina, ciclosporina, ciclofosfamida, micofenolato, penicilamina, tracolimo, adalimumabe, etanercepte, infliximabe, golimumabe, certolizumabe pegol, rituximabe, abatacepte, anakinra, tocilizumabe e tofacitinibe; incluiu, ainda, clorambucil e minociclina. 

Vinte e seis estudos observacionais abordando diversos resultados de segurança da terapia com bDMARDs atenderam aos critérios de elegibilidade: 15 direcionados a infecções graves, 4 a malignidades, 1 a mortalidade, 4 a eventos cardiovasculares e 2 a doenças pulmonares.

A pesquisa concluiu, confirmando estudo já realizado pelos pesquisadores em 2013, que houve um risco significativamente maior para infecções graves, principalmente tuberculose, em pacientes em uso de bDMARD se comparado a pacientes em uso de sDMARD. Não houve aumento do risco de infecção por herpes zóster, nem para malignidades em geral, linfoma ou não melanoma câncer de pele, mas o risco de melanoma pode ser ligeiramente aumentado.

Portanto, embora a pesquisa aponte que há relativa segurança para a utilização de bDMARD no tratamento da AR, os resultados não podem ser negligenciados e exigem uma mudança de atitude dos médicos, que devem examinar com mais cuidado e monitorar seus pacientes (incluindo profilaxia da infecção, quando indicado) e tratar infecções em pacientes em uso de bDMARDs apropriadamente.




* Columbia University Medical Center (USA); Leiden University Medical Center, University of Twente e University Medical Center Utrecht (Holanda); Universidade Nova de Lisboa (Portugal); University of Leeds (Inglaterra); Medical University of Vienna (Áustria); Charité -University Medicine Berlin (Alemanha).


Fonte: RAMIRO, Sofia; SEPRIANO, Alexandre; CHATZIDIONYSIOU, Katerina et al. Annals of the Rheumatic Diseases, n. 76, p. 1093–1101, 2017.