Mas por que os autoanticorpos
são importantes para doenças reumáticas autoimunes? Vários autoanticorpos
têm uma associação muito forte com algumas doenças e, por isso, são utilizados
pelos médicos como ferramentas de diagnóstico. Os médicos também usam a dosagem
de autoanticorpos para monitorar pacientes ao longo do tratamento, uma vez que
a concentração de alguns deles tem relação direta com o grau de atividade da
doença. Ou seja, à medida que o tratamento vai bem, os níveis de autoanticorpos
diminuem.
E uma pessoa com
autoanticorpos sempre terá uma doença autoimune? Não. O sistema imunológico
é muito complexo e tem uma infinidade de elementos moleculares e celulares em
constante interação, interação essa que também varia de pessoa para pessoa. Os autoanticorpos
de ocorrência natural fazem parte dessa complexa interação. Por isso, só a
constatação de um autoanticorpo no indivíduo, sem os sintomas ou sinais da
enfermidade autoimune associada, não é suficiente para definir que haverá
doença autoimune.
Qual a importância de estudar
o autoanticorpo no meio médico e científico? Desde que foram descobertos, o
estudo dos tipos de autoanticorpos e sua associação com certas doenças vem se
ampliando. Reumatologistas, por tratarem diretamente das doenças autoimunes,
conhecem bem o fenômeno. Mas há outras áreas da medicina em que esse conhecimento
é mais recente e também importante. Como, por exemplo, a neurologia. Nos
últimos 15 anos, mais de 20 novos autoanticorpos de grande relevância clínica
foram descritos em várias doenças neurológicas, permitindo diagnóstico adequado
e tratamento precoce de muitos pacientes. Este dinamismo no conhecimento
científico e médico sobre os autoanticorpos evidencia a necessidade de
atualização dos médicos e cientistas envolvidos com o tratamento de pacientes
com doenças autoimunes.
Será possível identificar os
autoanticorpos para determinadas doenças antes delas se manifestarem? É uma
possibilidade, já que se sabe que essas proteínas tendem a surgir (meses ou
anos) antes dos sintomas de doenças autoimunes. Por exemplo, os autoanticorpos
anti-DNA podem ser detectados até três anos antes de um paciente apresentar
qualquer sinal de Lúpus. Mas, na prática clínica, esta
possibilidade ainda está longe se concretizar por dois motivos. Primeiro porque
nem todas as pessoas portadoras de um autoanticorpo vão desenvolver uma
determinada doença; ao contrário, muitas terão um resultado positivo por anos
sem qualquer manifestação clínica. Segundo porque ainda não existe cura para as
doenças autoimunes, apesar dos avanços terapêuticos já existentes. Assim, a perspectiva é de que nos próximos
anos tenhamos alternativas efetivas para mudar o curso desses distúrbios e
impedir seu desenvolvimento em pacientes assintomáticos mas, até que isso
aconteça, ainda não há recomendação ou protocolos para tratamento preventivo em
pessoas sadias portadoras de autoanticorpos patológicos.
O que isso vai significar para
os pacientes? Se o avanço deste tema se concretizar, poderemos imaginar um
cenário em que doenças autoimunes serão ativamente rastreadas sob uma visão de
medicina preventiva, assim como hoje se rastreia o câncer de colo de útero, de
mama ou de próstata. Uma vez identificado um autoanticorpo patológico, o
indivíduo será submetido a exames adicionais que indicarão se ele teria
realmente propensão a desenvolvimento da enfermidade. Nesse novo paradigma,
haveria terapias efetivas que poderiam ser, então, aplicadas de forma a impedir
desenvolvimento da doença. Mas vale lembrar, uma vez mais, que esta realidade
ainda não existe e nos cabe esperar que venha a se concretizar nos próximos
anos.
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